Quando eu volto no tempo e consigo me lembrar das coisas que um dia sonhei, não sinto vontade de voltar àquela época. Os sonhos aconteceram. A vida seguiu o rumo e, para minha felicidade, mesmo com tantos atalhos, desvios, perdas, consegui realizar muitos deles.
Lembro de quando via TV antes de ir para a escola. Normalmente, o finalzinho do 'Xou da Xuxa'. Eu nunca nunca nunca fui de acordar cedo. Detesto até hoje, embora seja inevitável algumas vezes. Sempre assisti muita TV. Hoje em dia nem um décimo do que assistia naqueles anos (87, 88, 89... 2000). Foram quase 15 anos de muitas novelas, programas infantis, sessões da tarde, Jô, Chico Anysio, Hebe, Bozo, Sílvio Santos... até Sérgio Malandro. E, com isso, a minha vontade de um dia ter o meu próprio programa de TV. Era o sonho de criança. Sempre foi, embora tenham surgido outros sonhos.
Quando eu menos imaginei, ele se realizou. Não sem antes um outro acontecer: atuar e estar em cima de um palco. Esse sonho veio depois do sonho do programa de TV, e se concretizou primeiro. As coisas têm sempre uma razão de ser. Palco realizado, foi ele que viabilizou e me ajudou a apresentar os programas 'Janela Indiscreta' e 'Ultra POP', no canal a cabo 36, NET (Niterói/ São Gonçalo), com o empurrãozão da minha mãe e de Luiz Antonio Mello, facilitador. O primeiro programa, muito mais especial, era sobre o mundo do cinema, como o título já entrega. Nele, eu pude produzir especiais, mostrar, através de tantas imagens, padrões de vida, situações cotidianas, fantasia. Tudo aquilo que só a sétima arte é capaz de oferecer.
A música veio depois, com o segundo programa. Bandas, artistas, tudo que eu sempre ouvi a vida inteira ganhou vida (em formato MTV). Acabei realizando um mesmo sonho de duas formas. E tanto o cinema quanto a música renderam outros tantos. Um deles eu achei que jamais fosse realizar: cantar. Sempre fui desafinado, nunca gostei muito da minha voz. Mas, aconteceu também. Numa noite louca, véspera de uma viagem, me empolguei depois de duas caipirinhas e subi no palco (essa sensação é sempre indescritível e mágica) do Cinemathéque, e fui cantar 'Rebel Rebel', com a benção de seu autor, o camaleão David Bowie. Érika Martins, por total acaso, virou madrinha do acontecimento. Ela estava com o 'Chuveiro in Concert', grande karaokê ao vivo. Eu não desafinei. Lembro de pouca coisa. Sei que desci do palco e as pessoas me aplaudiram muito e vieram falar comigo. Eu só conseguia dizer que não sabia o que tinha acontecido. E duvidei de todos aqueles elogios. Mas parece que foram reais, pois fui convidado para uma outra ocasião: show de abertura do Lobão, no Morro da Urca. No segundo palco, outro 'Chuveiro in Concert' estava programado. Com muito medo de errar, cantei a mesma 'Rebel Rebel'. A essa altura, o sonho tinha virado realidade. Nunca tive ambição de nada maior. Eu apenas queria poder cantar uma música um dia.
E agora me resta o cinema. A fábrica de todos os sonhos vai me dar um outro prazer. E a pessoa responsável por isso não poderia ser mais amada: Leila Barreto. Por causa da constatação de todos esses sonhos e tantos outros, também não posso deixar de dizer que um dia uma entidade espiritual me disse que meu destino estava atrelado à comunicação. Não é à toa que trabalho em jornal, hoje em dia (a culpa é de Karla Rondom Prado), depois de passar por TV. E também não é à toa que realizei um outro sonho: o de ter o meu telefone, a minha mesa, o meu computador, no trabalho. Tudo meu, com as minhas fotos. Não podemos esquecer dos pequeninos, porque são cotidianos. Acontecem apenas. É involuntário. Mas, o melhor está por vir. Sempre está por vir. Não sou saudosista. Só tenho saudades do futuro.
- Guilherme Scarpa
- Rio de Janeiro, Brazil
- Sem uma verdade-conclusão, sigo escrevendo com paixão sobre tudo que absorve essa existência do cão.
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3 comentários:
"Só tenho saudades do futuro". Que lindo! Me identifiquei tanto!!! Adorei o texto, querido. E vou adorar realizar seu sonho de cinema. Só faltou o link da sua cantoria no Chuveiro da Urca...
Não falta mais: http://www.youtube.com/watch?v=0oMh_mIQ3Pg
Que texto bom, gostoso de ler!
Saudades do passado não tenho, apenas de algumas situações, o futuro é uma incógnita e o presente é a benção que nos permite fazer e acontecer.
Amo vc
beijos
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